domingo, 14 de agosto de 2011

Capitulo XIV

Capitulo XIV

    Diana aproveitou o resto das férias para se libertar dos seus antigos fantasmas. Despiu-se de todas as preocupações e ambições. Libertou-se dos objectivos e concentrou-se apenas no que lhe dava prazer. Descobriu uma Diana simples de sentimentos fáceis e com jeito para actividades radicais. Participou em todas as caminhadas por carreiros até então desconhecidos, mas foi no percurso que fez à volta da caldeira que Diana sentiu um novo chamamento para o seu futuro. Diana sentou-se um pouco numa elevação e sentiu a sua alma em sintonia com aquela calma aparente. O seu coração desacelerou o ritmo das preocupações e os seus olhos fecharam-se num relaxamento que sintonizou todos os seus sentidos com a paz daquele momento. Os pêlos dos seus braços eriçaram-se voluntariamente em resposta à carícia de uma brisa fresca. As narinas abriram-se desavergonhadamente ao cheiro de erva húmida e a sua alma conciliou-se devagar com a profundidade daquela cratera. Aquele lugar era o espelho do seu espírito. Um vulcão em tempos activo e o provável responsável pela existência daquela ilha maravilhosa. Um vulcão que se afirmou em consecutivas explosões incompreendidas e indesejadas que construíram um património. Um vulcão que viveu uma actividade alucinante em nuances de fluorescências e sentimentos palpitantes e que finalmente encontrara uma paz tranquila naquilo que construíra. Um vulcão de um encarnado vibrante que se deixou descansar numa grande cratera que agora brotava uma variedade lúcida de verde e que escondia vidas e vivências.
    Diana sentia essa calma na totalidade dos seus poros e os seus olhos repousavam naquela paisagem arduamente construída por aquele vulcão adormecido que contornava o enorme buraco numa longevidade de pastos divididos por hortências em flor que deixavam reflectir o azul do mar distante e dançante à volta daquele triângulo de ilhas. Mas esta calma dissipava-se com a aproximação da viagem de regresso que a conduziria de volta à sua vida tão desejada e suada. Diana tinha agora a responsabilidade da gestão de todo o grupo económico, incluindo os hotéis, os restaurantes e as agências de viagem. Era o braço direito de Bernardo e neste momento a única pessoa de confiança que ele tinha. Bernardo encontrava-se numa condição física muito debilitada. A doença apoderava-se do seu corpo com o mesmo efeito que uma manada de elefantes teria num pomar, e Diana não podia abandoná-lo nesta fase tão delicada. Acima de tudo devia-lhe lealdade... Mas ela não podia ignorar o chamamento daquela terra.
- Estou!... – Diana foi arrancada daquela sintonia com o ambiente envolvente pelo toque corriqueiro do seu telemóvel. – Bernardo! Que bom ouvir-te! Estava agora mesmo a pensar em ti!
- Coisas boas, espero! – Bernardo falava com a dificuldade dos fracos e Diana sentiu o coração apertar-se face a esse entendimento.
- Não me dás possibilidade de pensar mal de ti! Estás bem?
- Dentro dos possíveis! – Diana compreendia aquelas palavras. Era sinal que as dores lhe estavam a dar uma trégua. – Encontraste o Duarte?
- Sim! – Diana tinha em Bernardo, para além da pessoa do seu patrão, um grande amigo. Mesmo sabendo que Bernardo nutria por ela um sentimento muito mais forte do que amizade, naqueles anos nunca foi um assunto abordado. Era uma certeza que ambos partilhavam de uma forma muda e que nunca foi impeditivo para que a amizade entre eles se fortalecesse. – Mas não foi como esperava. Ele já refez a sua vida com outra pessoa!
- Lamento Diana! – Bernardo lamentava sinceramente. Apesar de amar aquela menina mulher que lhe entrara na vida de uma forma tão intempestiva, desejava vê-la feliz… Aliás, este era o seu único e último desejo.
- Evitei esta terra com todas as minhas forças Bernardo!... Mas agora que aqui estou sinto-me mais real nesta terrinha! – Diana fez um momento de silêncio, e como não obteve resposta do outro lado da linha continuou. – Não sei se o que vou dizer faz sentido, mas é como me sinto… É como se aqui fosse a verdadeira Diana. Como se a Diana que construiu essa vida tão desejada fosse uma farsa.
- Percebo! – Bernardo sentiu um aperto no coração. – Tens aí as tuas raízes. Foi aí que criaste a tua personalidade. Foi essa terra que te moldou e fez a pessoa incrível que tu és! – Bernardo fez uma retrospectiva à sua vida. Ele foi empurrado para aquela vida que não escolheu. Foi criado para continuar com o negócio de família e toda a sua vida foi um esforço para não falhar na missão que lhe foi incumbida. Não era nenhum coitadinho. Não era assim que se sentia. Pelo contrário, sempre se sentiu um privilegiado. Mas neste momento queria aliviar-se da pressão daquele património. Queria saborear a pouca vida que lhe restava sem confundi-la com a vida sonhada pelos pais. E era isso mesmo que iria fazer. – Diana?
- Sim!
- Fica aí mais uns dias!
- Não posso! Tenho de começar a analisar os lucros deste ano e começar a traçar as linhas orientadoras do próximo ano. Ainda falta um trimestre para terminar o ano e já temos os objectivos praticamente atingidos… quero que os funcionários sintam orgulho do seu trabalho e que se sintam admirados e respeitados por isso… Até tenho umas ideias que queria partilhar contigo sobre…
- Pára com isso, Diana! Eu sou o patrão e eu é que decido! Quero alargar o meu negócio aos Açores. Começa a procurar oportunidades por aí!
- Estás a falar a sério?
- Claro que sim!
- Vou começar já a tratar disso! – Diana sentiu a emoção vibrante que acompanha um novo desafio gratificante. – Gostava muito que conhecesses esta ilha, Bernardo! Um homem que conhece o mundo e que nunca veio ao lugar mais bonito deste planeta… É pecado!
- Quem te disse que eu não vou aí dar-te uma mãozinha?
    Diana não cabia em si de felicidade. Já há muito tempo que não sentia uma motivação tão forte a revolver-lhe as entranhas. Aquela terra é um poço sem fundo de oportunidades para investir no turismo. Ela vai fazer um trabalho de excelência e vai garantir uma ligação com aquela terra que lhe vai permitir regressar às suas origens com mais frequência.
    Quando a tardinha convidou a um regresso a casa Diana sentia a felicidade de uma forma que ela nunca tinha saboreado.
- O jantar está pronto!
    Diana respondeu a este chamamento de Raquel com a destreza dos olímpicos e em tempo recorde estava sentada na mesa completamente concentrada no seu olfacto que inalava sofregamente aquele cheiro apetitoso que só uma boa alcatra cozinhada num tacho de barro pode emanar. As narinas antecipavam o paladar que se degustaria no sabor da carne tenra que se desfazia na boca juntamente com a batata assada embebida num molho divinal. O jantar terminou com uma sobremesa sublime que satisfez os mais esquecidos desejos de Diana. Tratava-se araçás, um fruto pequeno e amarelo que fazia lembrar uma romã minúscula, mas com uma textura suave. A memória de Diana foi impulsionada para o passado. Naquela mesma casa, numa época em que esta era sombria, em que a decadência e as sombras dominavam o ambiente, Diana sentava-se debaixo da árvore-araçá, na companhia do irmão e abriam a boca enquanto sacudiam os galhos, na esperança que os frutos lhe caíssem directamente na boca. Pedro tinha sempre a agilidade de conseguir tal proeza para grande frustração de Diana que não gostava de perder nem a feijões.
- Esta árvore é a única coisa fértil nesta casa. – Diana constatava este pensamento sempre que terminavam a brincadeira.
- Um dia, esta casa vai palpitar vida e alegria! – Pedro contrapunha sempre com esta frase. Era um ritual que se repetia numa inconsciência necessária.
   Nessas alturas Diana achava o irmão um sonhador que se afastava da realidade criando falsas expectativas relativas àquele lugar que se assemelhava a um túmulo, onde ela se sentia enterrada viva. Hoje ao olhar para aquela casa onde se sentia um ambiente familiar e um calor humano que nunca sentira em outro lugar para além do café, Diana já não tinha tantas certezas de serem os sonhos dela os mais correctos, e a expressão “renascer das cinzas”, tomavam uma nova dimensão na vida que Pedro escolhera para si.
    O fim do jantar foi marcado pelo toque musical da campainha.
- Olá pessoa! Já estão prontos? – Guida entrou conhecedora do caminho e atirou a mala para cima do sofá, encaminhando-se de seguida para a cozinha onde começou a ajudar as mulheres da casa a tratar da louça. Paulo seguiu a mulher e encostou-se à bancada com uma cerveja na mão tagarelando com Pedro. Diana conseguia ouvir as vozes de José Gaitinha, Manuel e Mário na sala de estar a discutirem as melhores tácticas para melhorar o jogo do tão amado Benfica.
- Hoje falei com o Bernardo e ele disse-me para começar a procurar um lugar para abrir um hotel aqui! – Diana lançou a notícia sem aviso prévio e esperou uma reacção.
- Estás a falar a sério? – Foi Pedro o primeiro a expressar o seu espanto.
- Eu não brinco com assuntos de trabalho.
- Eu estou muito feliz! Isso significa que vais passar mais tempo por cá! – Raquel abraçou a amiga num gesto efusivo que reflectia bem a sua personalidade.
- Não te sentes assustado com o facto de te voltares a ligar a esta ilha? – Foi Paulo que fez a pergunta que sondava todas as mentes daquela cozinha.
- Sabes Paulo, durante anos lutei para me afastar desta terra inutilmente. É aqui que estão as minhas raízes, a minha família, as minhas memórias… Umas coisas excepcionalmente boas, outras terrivelmente más… Mas foi a junção de todas que resultou na pessoa que eu sou… Eu sinto-me muito ligada a este lugar… - Diana sentiu o lábio inferior tremer. – Pode parecer parvoíce… Eu sofri tanto aqui… Houve muito mais gente a maltratar-me ou ignorar-me do que a dirigir-me um sorriso… Mas aquilo que eu sinto quando estou aqui convosco é demasiado grandioso para ser sequer comparado às privações que passei. – Aquelas palavras foram ouvidas e sentidas por todos os presentes daquela casa e o abraço que uniu Pedro à irmã foi emocionado por um par de lágrimas em várias faces amigas.
- Vá lá! Acabem com essa choradeira que hoje é dia de festa! – Foi José Gaitinha que, limpando as lágrimas de orgulho que lhe rolavam pelas bochechas murchas, fez aquela gente regressar ao seu quotidiano.
    Saíram da casa de uma forma ruidosa e animada e dividiram-se pelos dois carros numa agitação engraçada que fazia lembrar um bando de crianças a lutarem pelos mesmos lugares. O caminho era longo para as distâncias de uma ilha e as curvas enjoavam um pouco Raquel, que só se distraia com as canções regionais que os amigos insistiam em cantar. A noite seria passada nas festas do varadouro. Umas festas que seguiam a tradição do arraial e umas tascas onde se podiam comer favas assadas e pernas de caranguejo. Os carros tinham de ser estacionados muito longe do lugar dos festejos, mas mesmo assim valia a pena o longo caminho a pé. Desceram a estrada escura e contornada por salgueiros e faias cantando desafinadamente a “sapateia”. Diana deliciava-se com a voz grossa de José Gaitinha que abria exageradamente a boca e pronunciava mal as palavras.
- Bem Gaitinha! Espero ter a oportunidade de te ouvir cantar mais vezes… És um verdadeiro Pavaroti da música popular açoriana! – Diana entrelaçou o seu braço no do velho que se inchou de importância.
- Se queres que te faça uma serenata é só pedires… Não precisas de me dar graxa…
- Estou tão contente… Neste baile vou dançar com as três mulheres mais bonitas da festa! – Mário esticava-se enquanto falava. – Sabem quando foi a última vez que isso me aconteceu?
- Quando eras pequeno? – Foi Manuel que brincou com a estatura de Mário, mostrando que até aquele resmungão estava animado.
- Ah! Ah! Ah! Muito engraçado este príncipe encantado pançudo! – Mário voltou-se novamente para as raparigas! – Nunca tal coisa me tinha acontecido… Hoje não quero mulheres barbudas…
A gargalhada foi geral e as luzes da festa foram recebidas com agrado. Assim que se aproximaram do baile, Pedro pegou em Raquel e levou-a para o meio da pista. Paulo fez o mesmo a Guida e Diana foi arrastada por Mário que estava inquieto que os olhares dos presentes se espantassem com a sua capacidade de arranjar um bom par. Os pares foram trocados graciosamente e Diana acabou por dançar com todos eles, até com Raquel. Diana vasculhava as feições dos presentes e conseguia distinguir os nativos daqueles que não pertenciam àquela ilha. Era como se uma linhagem distinta definisse as feições dos faialenses. Mesmo na geração mais nova, Diana conseguia perceber quais os seus compatrícios, e em alguns casos era capaz de identificar o lugar ou mesmo a família de onde provinham. É uma característica típica dos lugares pequenos, e talvez fosse esse um dos motivos que ligam estas gentes às suas terras… ali todos são identificados… Nunca são meros desconhecidos, mesmo que essa identificação seja negativa. Diana sentia que estava aberta a dar uma segunda oportunidade àquela ilha.
- Tenho de parar um pouco! Já não sinto as pernas… - Diana sentia-se tonta de tanto rodopiar.
    Abandonou a pista improvisada de dança e saiu daquela largo à procura de um lugar para se sentar. O pequeno muro que separava a terra do mar estava cheio de gente que tinha tido a mesma ideia e Diana começou a afastar-se um pouco das luzes na esperança de encontrar um lugar mais calmo. A festa terminava no último carrinho de algodão doce e Diana continuou um pouco mais o seu caminho. A noite estava um pouco fria e um arrepio invadiu-lhe a espinha, seguido de um forte instinto de olhar para trás. Diana ignorou este impulso e chegou mesmo a soltar uma gargalhada que continha um timbre nervoso. O cansaço que sentia nas pernas encorajaram-na a passar a zona escura dos balneários e a encontrar o muro que contornava a descida para umas piscinas naturais. A escuridão feria tanto os olhos que tentavam focar as formas no meio daquela ausência de luz. Quando finalmente encontrou um muro totalmente ao seu dispor, sentou-se e soltou um suspiro de alívio. As pernas pareciam pesar toneladas e aquele descanso foi mais que desejado. Quando os seus músculos começaram a relaxar, o seu coração retraiu-se face a um cumprimento de uma figura masculina cuja voz não lhe era completamente desconhecida.
- Excelentíssima doutora vira-lata! – Aquele cumprimento trouxe-lhe memórias os pontapés repetidos no estômago que sofrera sem que ninguém tivesse mexido uma palha para evitá-los.
- Olá Ruben! – Diana sentia-se tão nervosa a apavorada como nos seus tempos de adolescente. O seu corpo estava todo em alerta e o peso das pernas já não se fazia sentir, preparando-as para se pôr em fuga a qualquer momento.
- Então voltaste? – Ruben sentou ao lado de Diana de forma calma, o que fez com que a rapariga baixasse um pouco a guarda.
- Estou de férias. Devo voltar em breve! – Respondeu Diana num tom que tentava ser simpático.
- Estou a ver! – Ruben aproximou-se mais e Diana conseguiu sentir-lhe o bafo pestilento a vinho barato. – Eu cá acho que vieste tentar provar que já não és uma vira-lata…
- Eu nunca fui uma vira-lata! – Os músculos de Diana voltaram a retrair-se. E afastou-se um pouco discretamente.
- Já conseguiste tudo o que a tua ganância desejava… Só te falta conseguir uma última coisa que desejaste muito, não é assim Diana? – E com esta pergunta Rúben voltou a aproximar-se de Diana, agarrando-a com força pelo braço quando ela se levantou de uma forma desesperada. – Eu vou facilitar-te a vida e vou dar-te o que tu tanto desejaste durante a tua adolescência… - e encostando a sua boca de forma lasciva ao ouvido de Diana acrescentou – Não estás feliz Diana? Finalmente vais provar o desejado…
    Diana arregalou os olhos num entendimento momentâneo e o pânico invadiu-a de uma forma nervosa que se manifestava em gestos rápidos e desesperados, facilmente controlados pelo braço forte de Rúben que a rodeou prendendo-lhe os movimentos. Desesperada, abriu a boca para libertar um grito de socorro que depressa foi abafado pela mão livre daquele homem que parecia gigante. Aquele ser perverso preenchia todo o espaço que a rodeava e Diana sentiu que lhe começava a faltar o ar no meio daquele beijo desajeitado e lascivo. Rúben arrastava-a para o meio da vegetação intensa. Obrigou-a a deitar-se utilizando a força e a sua mão indiscreta começou a perscrutar o corpo de Diana de uma forma devassa, seguida pela boca ordinária. O pânico de Diana crescia e ela contorcia-se e esperneava. Um soco sentido no seu maxilar inferior fê-la acalmar-se uns segundos num reflexo de surpresa, mas depois os seus gestos tornaram-se mais desesperados. Nova chapada na cara incendiou ainda mais a luta de Diana que se esforçava por gritar e por se libertar daquele predador nojento que lhe percorria a intimidada usando uma força bruta. O seu corpo preso desesperava quando a mão grande e áspera lhe levantou o vestido e numa fracção de segundos já não sentia o peso do seu agressor. Sentiu que ele tinha voado e finalmente conseguiu gritar e chorar todo o medo que lhe dançava nas entranhas. Ficou sentada abraçada a si mesma esforçando-se por perceber o que se passava. Sentia que estava a haver uma luta, mas não conseguia perceber entre quem. Apenas diferenciava umas formas humanas que se agarravam sofregamente, para depois uma delas cair no chão e não se voltar a levantar. Ao sentir novamente alguém a aproximar-se Diana tentou levantar-se desajeitadamente, uma vez que as pernas lhe tremiam, e quando sentiu que esse alguém se sentava ao seu lado o pânico voltou a dominá-la. Uns braços envolveram-na e uma voz muito desejada segredou-lhe ao ouvido.
- Está tudo bem! – Duarte abraçava-a com força e a sua voz era rouca. Quando ele sentiu o corpo de Diana descontrair-se ele então começou a tentar perceber o estado físico de Diana. – Dói-te alguma coisa?
- Dói-me tudo! – Diana tinha uma vasta experiência com os maus tratos e percebia bem qual o significado daquela pergunta. – Mas não tenho nada partido nem deslocado… Só estou dorida…
    Duarte sabia que podia acreditar no deu diagnóstico, e levantou-a com cuidado encaminhando-a para o seu carro. O caminho, sempre em subida foi feito pacientemente devagar. E quando chegaram à viatura Diana não conseguiu evitar um sorriso.
- Tenho saudades do Fiat Punto! – Perante aquele cometário, Duarte não conseguiu evitar uma gargalhada. Ela lidava bem com a situação, não porque fosse uma situação pouco importante, mas porque ela estava habituada. Este pensamento provocou um aperto no peito de Duarte.
- Este Toyota Yaris é alugado! Dei o Fiat a uma senhora que trabalhava nas limpezas do hospital.
    Diana entrou no carro sem questionar o destino. Sentia-se segura na companhia de Duarte e queria alongar ao máximo o tempo que estava com ele.
- Devia ter avisado o meu irmão. Eles vão ficar preocupados.
- Não te preocupes! Vou enviar-lhe uma mensagem.
    Duarte sentia o seu corpo novamente em alerta como acontecia sempre que estava na presença de Diana. Sentiu que por baixo do perfume caro que ela usava ainda sentia aquele aroma doce que lhe lembrava sempre o cheiro do leite-creme. A sua garganta apertou-se ao sentir o olhar de Diana perscrutar-lhe as feições e sentiu que todas as forças da natureza o empurravam naquela direcção como se Diana fosse detentora de um poderoso campo magnético.
    O carro foi estacionado fora de uma casa geminada. Depressa Diana percebeu que se tratava da casa onde Duarte estava instalado. Entraram na casa vazia e Duarte foi buscar o estojo de primeiros socorros. Sentados na sala Duarte sentiu uma fúria crescer-lhe nas entranhas, quando olhou para o rosto de Diana e a vontade de ficar permanentemente com ela de forma a protegê-la foi incomensurável. Duarte olhou para aquele rosto reviveu o momento em que conheceu Diana, no hospital vítima de uma violência extrema que se espelhava num rosto inchado. Desde essa altura que Diana faz parte da sua vida, dos seus mais frequentes pensamentos, desejos e ambições. Enquanto lhe limpava o rosto com um algodão embebido em água de forma a remover a terra e as poeiras, Duarte sentiu naquele contacto inocente a certeza de que o seu futuro casamento acabava de ficar sem efeito.
- Está muito feio? – Perguntou Diana, tentando cortar aquele silêncio que começava a enervá-la.
- Tens um hematoma junto ao queixo e alguns nos braços e pernas. Fora disso estás óptima e recomenda-se.
- Obrigada! Se não tivesses aparecido…
- Não digas mais nada… - Duarte nem queria imaginar o que poderia ter acontecido para além dos hematomas… - Eu sou um super-herói muito atento, sempre pronto a ajudar donzelas em apuros
    A gargalhada nervosa que Diana deixou libertar, fez com que Duarte pasmasse naquela figura delicada e emocionou-se com a capacidade dela ultrapassar os momentos difíceis. Admirava-a com toda a sua sabedoria, e naquele exacto momento desejava-a na sua vida com todas as suas forças. Os movimentos com o algodão deram lugar a carícias suaves que Diana não recusou o seu olhar profundo antecipou o momento lento que se seguiu e desabrochou num beijo meigo que foi permitindo um envolvimento mais intimo aproximando-os numa paixão inadiável. Duarte pegou em Dina sem lhe libertar o olhar e conduziu-a ao quarto, onde se fundiram de corpo e alma num entendimento lento e profundo que os tornou num único ser.

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